Lula fala como testemunha de Cabral e dá show particular. MPF e juiz Bretas deixam claro que não saber o que quer dizer “política”
Por: Reinaldo Azevedo
Publicada: 05/06/2018 - 17:10
O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva depôs, por videoconferência, como testemunha, na ação penal que apura se autoridades brasileiras compraram votos de membros do COI (Comitê Olímpico Internacional). São réus na ação, entre outros, Sérgio Cabral, ex-governador do Rio, e Carlos Arthur Nuzman, ex-presidente do COB (Comitê Olímpico do Brasil).
O momento acabou, com efeito, sendo emblemático dos dias em curso. Houve ali uma espécie de sumo e de síntese deste tempo. Atenção! De saída, deixo claro: não sei se houve compra de voto ou não. Não sou Justiça. Conheço a acusação. Vamos ver os desdobramentos. Uma lembrança: Lula prestou depoimento ao juiz Marcelo Bretas, da 7ª Vara Federal do Rio, como testemunha de defesa de Cabral. De saída, destaco duas coisas:
a: a suposta tietagem de Bretas, que fez mesuras um tanto ambíguas a Lula no fim do depoimento, de olho na própria reputação, tentando usar o ex-presidente como escada;
b: a evidência, mais uma vez expressa, de que o Ministério Público Federal e setores do Judiciário ignoram o que seja política e que só ganhou a saliência que tem no atual estágio da história brasileira porque criminaliza a mais nobre e mais importante prática das democracias: justamente a… política! É a única alternativa que temos à guerra de todos contra todos.
a: a suposta tietagem de Bretas, que fez mesuras um tanto ambíguas a Lula no fim do depoimento, de olho na própria reputação, tentando usar o ex-presidente como escada;
b: a evidência, mais uma vez expressa, de que o Ministério Público Federal e setores do Judiciário ignoram o que seja política e que só ganhou a saliência que tem no atual estágio da história brasileira porque criminaliza a mais nobre e mais importante prática das democracias: justamente a… política! É a única alternativa que temos à guerra de todos contra todos.
Começo pelo segundo aspecto. Ficou evidente que Marcelo Bretas e os dois representantes do Ministério Público Federal não sabiam o que perguntar a Lula. Não haviam se preparado para a audiência. Reitero: se houve safadeza ou não, não posso afirmar nem uma coisa nem outra. Em tendo havido, e sendo Lula quem era naquele caso, nem Ministério Público nem juiz conseguiram fazer uma única, uma miserável que fosse, questão relevante que ensejasse ao menos algum esclarecimento da defesa de Cabral. Nada vezes nada. E essa tem sido a rotina. Tanto é assim que qualquer aferição técnica de credibilidade daria um placar de 10 a zero a favor de Lula. Vamos ver.
Quando a palavra foi passada ao Ministério Público Federal, o procurador quis saber se Lula havia se encontrado, alguma vez, com Nuzman. Com a devida vênia, a resposta é óbvia porque a pergunta estúpida. Ora, eu, que não acompanho esse troço, sei que sim. Estranho seria se o presidente do COB não se encontrasse com o presidente da República, que havia transformado o desejo de o Rio sediar a Olímpiada numa questão geopolítica. Notem que, mais uma vez, não entro no mérito se a coisa, em si, foi positiva ou não.
Lula disse ter-se encontrado várias vezes, mas não lembrava quantas. Alguma vez com a presença de africanos?, quis saber o farejador. Ora, sim, claro!, afinal o Brasil estava de olho nos votos da África.
E o ex-presidente, então, ofereceu a deixa para o momento mais constrangedor do depoimento, protagonizado pela representante do Ministério Público, Cristina Groba Vieira. A imprensa nem se deu conta porque, também ela, anda um tanto esquecida do que é política. Especializou-se, com raras exceções, na linguagem da polícia, que lhe é soprada por vazadores do MPF, da PF e da Justiça.
Lula afirmou que fez, sim, um trabalho junto a países africanos, continente no qual ele era um verdadeiro “pop star” — isso digo eu, e é fato —, cumprindo, aliás, uma obrigação uma vez que uma cidade brasileira era candidata a sediar o evento. Num dado momento, o ex-presidente afirmou que deixou claro aos africanos que o Rio sediar uma Olimpíada abria caminho para que o continente africano viesse a receber os jogos.
Essa frase despertou na procuradora o olfato para o crime. A pergunta feita por ela, ensejada pela fala de Lula, é das coisas mais patéticas jamais ouvidas num tribunal. Ela quis saber, então, se Lula havia prometido aos africanos alguma vantagem indevida. Venham cá: digamos que Lula tenha dito aos africanos: “Apoiem o Brasil, e o Brasil passará a defender que a África seja sede dos jogos”. O que haveria de errado nisso? É uma estupidez! Deu a Lula o pretexto para lembrar: “Eu viajei 34 vezes para a África. Visitei 29 países na África. Abri 19 embaixadas na África. Levei a Embrapa para a África…”
Se Lula estivesse solto, e se o Ministério Público e o juiz Marcelo Bretas lhe dirigissem perguntas uma vez por semana, ele se elegeria no primeiro turno…
Depois foi a vez de o juiz perguntar a Lula se tinha ouvido a conversa de que o Rio sediar a Olimpíada era uma espécie de etapa prévia da candidatura de Sérgio Cabral à Presidência… O petista afirmou nada saber a respeito. Mas venham cá: e se fosse? Os crimes de Sérgio Cabral não estariam nessa pretensão, certo?
Finalmente
Noto, finalmente, que o juiz Marcelo Bretas resolveu abrir espaço para a demagogia pessoal. Embora tenha advertido Lula para não fazer proselitismo político, ele próprio, o juiz, deu-se ao desfrute de lembrar a importância de Lula para o Brasil e disse que, aos 17, 18 anos, estava num comício petista com mais de um milhão de pessoas e coisa e tal.
Noto, finalmente, que o juiz Marcelo Bretas resolveu abrir espaço para a demagogia pessoal. Embora tenha advertido Lula para não fazer proselitismo político, ele próprio, o juiz, deu-se ao desfrute de lembrar a importância de Lula para o Brasil e disse que, aos 17, 18 anos, estava num comício petista com mais de um milhão de pessoas e coisa e tal.
Bretas o fazia para puxar o saco de se Lula? Não! Estava apenas puxando o saco de si mesmo. Pretendeu, com isso, demonstrar que é um juiz isento, que não tem adernamento ideológico nenhum, que cumpre a sua função com rigor técnico. Bem, convenham: estivesse Lula depondo como réu, isso ainda poderia fazer algum sentido. Mas ele era testemunha. Bretas usava o ex-presidente como escada para tentar robustecer a sua mitologia pessoal.
Rápido, como de hábito, Lula emendou, rindo discretamente: “Pode voltar agora. Quando eu fizer um comício, vou chamar o senhor para participar”.
Pois é… Lula sabe que tão cedo não fará comício nenhum. Com efeito, seus adversários têm mesmo o que comemorar. Até agora, em todas as audiências de que participou, não importa em que condição, o MPF não conseguiu apresentar uma única evidência que tenha encostado o ex-presidente na parede.
Nem era o caso da sessão desta terça. Ele era testemunha apenas. Mesmo assim, teve um desempenho notável e, ora vejam, deu ao Ministério Público Federal e ao juiz Marcelo Bretas uma aula prática sobre política.
Se toda a operação foi criminosa, que o MPF apresente as evidências. Mas uma coisa é certa: essa gente não sabe o que é e para que serve a política. Todos sabem que acho que o PT fez um mal imenso ao país. Eu fui o mais dedicado cronista desses malefícios. Mas não se combate o petismo combatendo a política. Ao contrário: isso ajudou a ressuscitar o partido e esta empurrando o país para o abismo.
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